#8 brisa Leve; brisa lê, brisa escreve
E aí!
As manhãs devem ser longas para que a tarde seja longa e a noite seja breve. De praxe, a noite é sempre breve. Se durmo é breve, se varo a madrugada… É breve. Se me envolvo pelada noite afora é breve. A noite foi feita para ser uma doce lembrança ou um ressentimento amargo que se prolonga intermitentemente. Você pode esticar a noite, mas noite é mola. As manhãs devem ser longas porque a vida é breve e as noites são lampejos. As manhãs devem ser longas para que nada as separem da noite.
Pois é, ainda estou na toada d’As Intermitências da Morte.
Não temos consciência de que há em nós a imortalidade dos dias. Tampouco a consciência de que tudo, enquanto não acaba, é imortal. E tudo, portanto, é perpétuo e eterno até que se finda. Já dizia a canção…
A imortalidade causou alvoroço e euforia a princípio nessa história. Boa notícia: não se morre mais. Ok. Pouco tempo depois, a morte estava sendo solicitada por toda a tênue fronteira desse país em que até a rainha, à beira da morte, ficou em estado suspenso de vida. Muitos, que já estavam cursando para o fim de vida, como a rainha doente, precisavam do lastro da morte. Não o tiveram.
A morte digna é um direito.
O caos se instalou justamente porque os familiares, ao verem o sofrimento (físico e existencial) de seus entes, os levavam à fronteira para que a morte lhes fosse dada como direito e dignidade última.
Saramago, numa entrevista, vai dizer que a morte é individual e caminha conosco lado a lado desde sempre: morre conosco quando morremos. A dignidade de morrer não vem da morte que nos é decidida pelo outro, mas da morte que nos constitui em tempo e espaço. Por isso que o médico não é a morte, porque não cabe a ele decidir, Saramago ainda completa.
Imaginemos que esse país, que serve de cenário para essa fábula, é um hospital. As pessoas que estão em estado de morte suspensa, pedindo pela morte, são pessoas absolutamente vivendo - e convivendo - em um sofrimento físico lancinante e sofrimento existencial igualmente angustiante.
O desespero nos impulsiona a escolhas improváveis. Por isso que muitos pacientes com suas dores e seus sintomas mal controlados, pedem para morrer. Esquece-se que ao tentar vencer a doença obstinadamente, o médico coloca em cheque a qualidade de vida do próprio paciente.
No livro, essa dimensão singular sai do escopo daquele cabo de guerra médico-paciente. Não há uma figura postergando a morte na tentativa de apenas manter o paciente vivo (o que é vida?), achando que o curso natural da morte é a abreviação precoce da vida. O curso natural da morte é dos direitos mais dignos desde que haja o cuidado.
A pessoa deve estar sendo cuidada de forma holística, em todos os seus âmbitos, porque o sofrimento é complexo. Nós somos cheios de camadas e histórias e contextos… Vixi!
Estou falando tudo isso para falar de Cuidados Paliativos?
Agora uma listinha:
Clarice é a vida (e Benjamin Moser é o biógrafo dela).
Existe um movimento que se chama Slow Medicine (que é como eu vejo e busco a Medicina, enfim as coisas tem mudado!) que abraça os Cuidados Paliativos. Esse episódio do podcast Slowcast fala desse encontro que, pra mim, é uma das coisas mais bonitas e necessárias nesse universo em que a doença é mais importante que o doente (é um clichê irônico e triste).
Luz e sombra sobre tela.
De novo e sempre vou recomendar o podcast Finitude. Esse episódio tem quase um ano, mas por esses dias ouvi novamente. Que coisa linda: sonhos são ajustáveis sim. Pra quando você for fazer qualquer tarefa de casa, pra quando você quiser descansar das telas, pra quando você estiver caminhando ou correndo… podcasts caem bem.
Inté!